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sexta-feira, 5 de julho de 2013

O LUNDU



 












Poucos já viram dançar o lundu; muitos sequer ouviram falar desse bailado primitivo e empoeirado    já que foi trazido da África e, portanto, era dançado pelos escravos nos eirados de terra nua.  A coreografia original, é claro, foi modificada através dos tempos, até porque só mesmo os negros daquela época, curtidos no eito e dotados da elasticidade que dá a constante atividade física, eram capazes de executá-la   inclusive como derivativo, como meio de anestesiar a mente e abrandar as misérias de prisioneiro escravizado. Jamais conheceremos o verdadeiro lundu. Eu já assisti a um que era razoavelmente "africano" mas, suponho, já derrancado, cheio das invencionices de novidadeiros tolos.
Nascido entre as paliçadas das aldeias, dançado sob os olhares severos de sobas e feiticeiros, o lundu chegou ao Brasil pelo traficante maldito que nas savanas africanas apresava mão de obra para a Colônia. Era, pois, dança de gente dotada de grande agilidade, com o traquejo atávico na arte/ciência de sobreviver por séculos sobre séculos em ambiente rude e hostil, onde cada palmo de chão era disputado com bichos ferozes,  entre toda sorte de perigos. Daí as características das danças com certidão de registro lavrada na África, cheias de improvisos, de surpresas, volteios e negaças. Assim, o  lundu nunca foi, nem seria, dança de sinhozinho e sinhazinha, reinóis molengas e empenados.
Nada obstante, e certamente pelo fascínio que despertou, o lundu foi assimilado (mal) por brancos, como se pode ver nos desenhos de Rugendas e Debret. E desse desastre resultou a desfiguração do fogoso bailado. O Lundu de hoje, onde ele raramente acontece, é apenas uma deformação tosca, no qual  se sucedem pulos desconjuntados e rodopios sem graça. 


Pensar nisso lembra-me o Zé do Sarney, aquele do bigode. Faz anos, quando ele governava, e eu escrevia para o extinto “Diário da Tarde”, veio a lume a portentosa obra poética do maranhense. Ah, maior que Bilac, superior a Neruda, faria corar de vergonha Ruben Dario, mesmo Calderòn, até Camões. Que verve! Que facúndia!  Os “Marimbondos de Fogo” de Sarney incendiaram o Planeta. E as mentes da Academia, que, reduzidas a cinza estéril, acolheram-no sem ao menos se perguntar a razão disso. E até hoje ele veste o fardão de bordaduras militares e sinhaninhas rococó; sem contar o chapéu tipo canoa, estilo Caxias, ornado de plumas brancas   que ficava muito bem no ilustre Luiz Alves de Lima e Silva mas,  a todos os títulos, desgracioso no poeta.
Então escrevi no dito jornal que os marimbondos de Sarney eram perigosíssimos: caíam   em voo picado no rabo dos literatos, e só lá, resultando que esses letrados,  no desatino doloroso que lhes causava o fogo dos ditos vespídeos, desgovernavam e se punham a cabriolar como mamulengos    como num lundu mal dançado. Fui severamente admoestado, mas nunca houve (tirante os da Academia) quem fizesse um só elogio, mesmo uma referência aguada, aos poemas em apreço...

É onde eu te falo...

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