Importante é a versão, não o fato. Consta que um político é autor
da frase; cujo nome não interessa, até porque em torno dessa autoria há também
muitas versões. De todo modo, o fato é sempre unívoco, enquanto as versões são
variante sem compromisso com a realidade. O assunto diz com o notório horror de algumas
facções cristãs às bebidas alcoólicas, embora nenhum adepto dessas correntes,
proibido de beber álcool, se lembre de perguntar de onde vem essa proibição. O
islamismo não se inclui nessas correntes ambíguas, pelo óbvio: o Corão veda
expressamente o consumo de bebida alcoólica – ou seja, sabe-se a origem desse veto
ao álcool. Aliás, entre os livros religiosos, sempre achei que o Corão é,
inteligentemente, muito objetivo.
Andei indagando dos religiosos
inimigos do álcool onde, nos seus textos sagrados, está escrito que o adepto
não pode degustar o vinho, por exemplo. Claro, só obtive respostas tolas, de
cunho subjetivo, todas incoerentes. Larguei pra lá. Mas quando encontrei na
Internet a afirmação – claramente manipulada – de que Cristo não bebia vinho,
mas suco de uva, sem álcool, fiquei perplexo. Ora veja! Então, nas bodas de
Canaã, como na última ceia, a “carta de vinhos” se resumia a... suco de uva.
Oh, Diabo, cada vertente diz uma coisa!!
No entanto, essa é a versão. Quem
se interessar vá ao Google e digite, por exemplo “Cristo bebia vinho?” E se
divertirá com os malabarismos dos “escribas” para justificar, com foros de dogma
feroz, a abominação ao álcool. E verá como são marotos esses escribas que pregam, por
escrito e por via oral, que na Bíblia só gentios, fariseus, fornicadores e outras modalidades de ímpios, tomavam lá o
seu vinhinho. A propósito, também consta que o mosto das melhores cepas, naquele tempo, era vinificado na Síria, então
grande exportadora de vinho.
Aí bate o sininho – sempre ele,
esse danado – e me surge uma nova questão. Ora, o álcool é um composto orgânico de fórmula R-OH, na qual R é um radical
alquila; e alquila é um radical orgânico monovalente de fórmula geral CnH2n+1, formado pela remoção de um
átomo de hidrogênio de um hidrocarboneto saturado. Cultural, né? Mas, não, não sou lá tão versado
em Química Orgânica quanto possa parecer. A explanação é do Houaiss, à falta de
um compêndio dessa matéria. Seja como for, independente dessas definições
grandiosas, vale anotar que o álcool é um conservante excepcional. Cautela! Não
há aqui apologia ao consumo de álcool, mas a lembrança de uma lei natural “antiga
e aceita”. O que se quer dizer é que o suco de uva derranca se não se lhe
acrescenta... álcool.
Assim, nos Orientes Médios, de clima
notória e excepcionalmente abrasado, como os hebreus de Yahweh e os judeus de
Cristo conservavam todo o suco de uva que era uma constante nas respectivas
dietas de terra quente de água escassa? Aí os escribas se superam. Sabem o que
eles dizem? Pois dizem que esse suco, sem álcool era conservado em ânforas
herméticas submersas em água! Mas que água? O Oriente Médio, tirante o Tigre e
o Eufrates, mesmo o minguado Jordão, não era pródigo em águas. Vá lá, havia os
mares Vermelho e Morto, até o da Galiléia, além de um oásis aqui, outro ali,ou outro, espalhados
nos areais e carrascais intermináveis. Basta ir ao Atlas e confrontá-lo com os
lugares bíblicos – no mais das vezes, há um mundo de areia e pedra a afastá-los
de qualquer fonte de água. Ah, e para colorir a tese do suco sem álcool os
escribas alardeiam que até os romanos conservavam o mosto em água. Bem,
excepcionalmente e para emprego rápido, pode ser, mas daí a justificar a
proposição de que suco de uva puro pode durar de uma vindima até a próxima, um
ano depois... Sei lá.
Pois é. O fato
é de somenos. Importante é a versão. E versão, desde a Antiguidade, é nada além
de embromação, invencionice feita de irrealidades, bona aut non bona fides (*) - o que
lembra, vagamente, um verbo da terceira conjugação, hoje em desuso, excepcionalmente
significativo: engrupir. Consultar
Houaiss ou Aurélio enquanto abro um Sauvignon Blanc geladinho para acompanhar a
terrina de mexilhões frescos que me fez a adorável Andréa.
É onde eu te
falo...
(*) de boa ou de má fé
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