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domingo, 10 de fevereiro de 2013

"IN VINO VERITAS" ou "VERITAS IN SUCO" ?




Importante é  a versão, não o fato. Consta que um político é autor da frase; cujo nome não interessa, até porque em torno dessa autoria há também muitas versões. De todo modo, o fato é sempre unívoco, enquanto as versões são variante sem compromisso com a realidade. O assunto diz com o notório horror de algumas facções cristãs às bebidas alcoólicas, embora nenhum adepto dessas correntes, proibido de beber álcool, se lembre de perguntar de onde vem essa proibição. O islamismo não se inclui nessas correntes ambíguas, pelo óbvio: o Corão veda expressamente o consumo de bebida alcoólica – ou seja, sabe-se a origem desse veto ao álcool. Aliás, entre os livros religiosos, sempre achei que o Corão é, inteligentemente, muito objetivo.
Andei indagando dos religiosos inimigos do álcool onde, nos seus textos sagrados, está escrito que o adepto não pode degustar o vinho, por exemplo. Claro, só obtive respostas tolas, de cunho subjetivo, todas incoerentes. Larguei pra lá. Mas quando encontrei na Internet a afirmação – claramente manipulada – de que Cristo não bebia vinho, mas suco de uva, sem álcool, fiquei perplexo. Ora veja! Então, nas bodas de Canaã, como na última ceia, a “carta de vinhos” se resumia a... suco de uva. Oh, Diabo, cada vertente diz uma coisa!!
No entanto, essa é a versão. Quem se interessar vá ao Google e digite, por exemplo “Cristo bebia vinho?” E se divertirá com os malabarismos dos “escribas” para justificar, com foros de dogma feroz, a abominação ao álcool. E verá  como são marotos esses escribas que pregam, por escrito e por via oral, que na Bíblia só gentios, fariseus, fornicadores  e outras modalidades de ímpios, tomavam lá o seu vinhinho. A propósito, também consta que o mosto das melhores cepas, naquele tempo, era vinificado na Síria, então grande exportadora de vinho.
Aí bate o sininho – sempre ele, esse danado – e me surge uma nova questão. Ora, o álcool é um composto orgânico de fórmula R-OH, na qual R é um radical alquila; e alquila é um radical orgânico monovalente de fórmula geral CnH2n+1, formado pela remoção de um átomo de hidrogênio de um hidrocarboneto saturado.  Cultural, né? Mas, não, não sou lá tão versado em Química Orgânica quanto possa parecer. A explanação é do Houaiss, à falta de um compêndio dessa matéria. Seja como for, independente dessas definições grandiosas, vale anotar que o álcool é um conservante excepcional. Cautela! Não há aqui apologia ao consumo de álcool, mas a lembrança de uma lei natural “antiga e aceita”. O que se quer dizer é que o suco de uva derranca se não se lhe acrescenta... álcool.                 
Assim, nos Orientes Médios, de clima notória e excepcionalmente abrasado, como os hebreus de Yahweh e os judeus de Cristo conservavam todo o suco de uva que era uma constante nas respectivas dietas de terra quente de água escassa? Aí os escribas se superam. Sabem o que eles dizem? Pois dizem que esse suco, sem álcool era conservado em ânforas herméticas submersas em água! Mas que água? O Oriente Médio, tirante o Tigre e o Eufrates, mesmo o minguado Jordão, não era pródigo em águas. Vá lá, havia os mares Vermelho e Morto, até o da Galiléia, além de um oásis aqui, outro ali,ou outro, espalhados nos areais e carrascais intermináveis. Basta ir ao Atlas e confrontá-lo com os lugares bíblicos – no mais das vezes, há um mundo de areia e pedra a afastá-los de qualquer fonte de água. Ah, e para colorir a tese do suco sem álcool os escribas alardeiam que até os romanos conservavam o mosto em água. Bem, excepcionalmente e para emprego rápido, pode ser, mas daí a justificar a proposição de que suco de uva puro pode durar de uma vindima até a próxima, um ano depois... Sei lá.               
Pois é. O fato é de somenos. Importante é a versão. E versão, desde a Antiguidade, é nada além de embromação, invencionice feita de irrealidades, bona aut non bona fides (*)  - o que lembra, vagamente, um verbo da terceira conjugação, hoje em desuso, excepcionalmente significativo: engrupir. Consultar Houaiss ou Aurélio enquanto abro um Sauvignon Blanc  geladinho para acompanhar a terrina de mexilhões frescos que me fez a adorável Andréa.
É onde eu te falo...  

(*) de boa ou de má fé       

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