Há anos li uma história. Era madrugada, em
Londres. Um carro – talvez um Aston Martin de muitos cilindros – contorna a
praça em alta velocidade e recebe do policial a ordem de parar. O motorista freia
e é abordado pelo policial que, só então, verifica se tratar de Sua Alteza Real
Charles de Windsor. Impassível, mas cerimonioso, cumprimenta Your Highness, o Príncipe de Gales, a
quem entrega a intimação para comparecer à presença do juiz no dia seguinte. Charles se
apresenta ao tribunal, reconhece a sua falta, é censurado, admoestado, e deixa
o prédio com a nota da multa que lhe foi imposta por desrespeito à lei de
trânsito. Igualzinho no Brasil.
Essa
história me veio quando li no jornal que os padres não devem se sujeitar às severidades
da Lei Seca. Isso mesmo. Basta-lhe dar uma carteirada nos “home” e dizer: “-
Qualé, ô meu? Sou padre e acabo de celebrar missa, onde transformo vinho em
sangue, tá sabendo, jacaré? E mais uma vez o Código Penal vai pro brejo.
A notícia
diz que a CNBB rejeitou com certa aspereza a sugestão de, nas missas, o
celebrante usar suco de uva em vez de vinho. Até que Sua Santidade Benedictus
XVI autorize expressamente o emprego do suco, a transubstanciação continuará a
ser feita com vinho mesmo. Assim, como vinho tem álcool e os padres se vestem
como qualquer do povo, a eles, se colhidos numa blitz, basta alegar a sua condição
de padre para se eximir do bafômetro. E mesmo que o sopre - hipótese bem remota
- a eventual detecção de álcool não
tipifica o delito que a chamada “tolerância zero” pretende combater. Trem
doido, isso. Mas prosaico, a bem dizer.
Prosaico,
mas que conduz a grave questão de ordem metafísica. O vinho consagrado se
transmuda em sangue e, pois, razão não há para que os padres se arreceiem de
soprar o bafômetro, visto que só tem álcool o sangue de quem bebeu álcool - o
que não é, obviamente, o caso do padre que fez a transubstanciação e bebeu o
elemento resultante -sangue, não vinho. O conselho que a CNBB dá aos
padres, de dar carteirada e se recusar ao bafômetro sob a alegação de que é
padre, não faz sentido. Ou será que faz?
É onde eu te
falo...
PS 1 - Acho que a vírgula antes de “não dirija” é
perfeitamente dispensável.
PS 2 - Este texto foi escrito pouco antes da renúncia de Benedictus XVI, a julgar
pelos noticiários.
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