Páginas

terça-feira, 21 de agosto de 2012

MOISÉS, NETO DE FARAÓ...


Pode-se ler o Velho Testamento de dois modos: com olhos de crente religioso pautado na Revelação; como leitor que apenas quer ler. Aquele o considera um livro sagrado, ditado por Deus, conforme a sua crença; este o lê como obra literária. Ou seja, cada um tem a sua motivação, personalíssima. Por mim, considero que ler as Escrituras com a visão específica do sobrenatural desperdiça-lhe a parte não-sobrenatural; um reducionismo. Já aquele, digamos, não-alinhado, que as lê com olhos de simples leitor, que se fixa na história humana ali narrada, tem enorme proveito intelectual. 
Seja como for, o Velho Testamento tem o poder de fascinar quem o lê. Nem o curso do tempo, contado em milênios, conseguiu atenuar o seu encanto  -  independente do espírito de quem o lê: religiosos, em razão de fé; gentios e livre-pensadores, tomando-as como resenha de uma época ou momento histórico, que contém dados sociológicos, legais, antropológicos, geográficos... enfim, um monumento de amplo espectro. Seja como for, as Velhas Escrituras agradam a todos.  
Vamos ao aparecimento de Moisés em Gêneses, visto por um não-alinhado. Ali consta que ele era levita da gema, filho de Amram, e sua mulher Yocabed; e que esta, vendo que seu bebê era muito formoso, escondeu-o por três meses, até que a situação ficou insustentável. Assim, colocou-o num cestinho de vime que deitou nos juncos à beira do rio (Nilo) e mandou que sua filha observasse o que aconteceria. A pequena viu que a filha do faraó, que descera para se lavar no rio, acolheu o bebê e o entregou a uma hebréia a quem pagou para dele cuidar. Anos depois a tal filha do faraó o adotou.
Inverossímil a mais não poder. Primeiro, que mãe abandona o filho de peito num rio apenas  porque ele é formoso? Tirante a fugidia hipótese de um transtorno puerperal, não há explicação para a atitude de Yocabed. No entanto, os obstetras não apontam precedente de febre do puerpério que dure três meses, idade do pequeno Moshe abandonado no rio.   
Depois, é inaceitável a filha do faraó tomando banho no Nilo. Os egípcios eram o povo adiantado, dotado de extraordinário senso estético; preocupados com a beleza física, detinham  tecnologia própria de fabricar sabões e cosméticos. Um povo assim teria severos hábitos higiênicos. Aliás, a comunidade arqueológica divulga que os egípcios mais abastados tinham mesmo um sistema doméstico de filtrar água em tanques comunicantes, cada tanque contendo um elemento filtrante de granulação variada - que ia da brita à areia mais fina, de modo que a água depositava no primeiro tanque as impurezas mais grossas, e assim sucessivamente, até escoar límpida do último.
É óbvio, pois: se as casas das famílias ricas eram munidas desse sistema de filtragem, com mais razão o teria o palácio do faraó. Então, por que a filha do Rei dos Dois Egitos, ela, justamente, faria semicúpios no rio?  É difícil imaginar a filha do faraó passando largos tempos sem banho, durante a estação das cheias do Nilo, que encharcavam de húmus suas margens numa extensão considerável; ou admitir que na época da inundação anual a gentil princesa se banhava na barrela, que – embora altamente fertilizante, ou talvez por isso – devia ser muito fedorenta.
O bebê hebreu no bercinho de junco, com cueiros de riscas à levita e posto nas águas do Nilo, tão lírica e convenientemente recolhido pela filha do faraó, se apresenta, pela própria inverossimilhança, como um simbolismo primariamente singelo: os seres vivos vêem da água; sem água não há vida. Fora disso não se encontra motivo plausível para a filha do faraó, ao invés de se banhar “posta em sossego” nas piscinas cristalinas do palácio, o fizesse diretamente no rio bruto entre pernilongos e crocodilos, lodos, e até as nada implausíveis sobras intestinais jogadas a montante.
Daí a minha opinião: Moshe, o famoso Moisés do Êxodo, podia ser filho do levita Amram, mas não nascido de Yocabed; era filho da princesa, e, pois, neto do faraó. Este, segundo a opinião majoritária de historiadores, arqueólogos e egiptólogos, seria Seti I, o sábio, pai do famoso Ramsés II, da 19ª. Dinastia.

É onde eu te falo...

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Caso queira, faça contato direto por email: rubens2instancia@hotmail.com