Com ligeira saudadinha, vejo - e ouço, é claro -
a orquestra de Ray Conniff tocando o indefectível Besame Mucho à maneira Anos 60, num admirável arranjo para metais e
coro. Acho que a peça era uma das faixas do famoso ‘S Dance, que encantou o mundo, açucarou as horas dançantes de
sábado à tarde, e mostrou novas técnicas de harmonia e contra-ponto da chamada
música popular.
Parênteses - Na verdade, Ray Conniff não foi tão inovador assim. Coisa de século e meio antes Beethowen, que já rendera para sempre a arte musical com a Nona Sinfonia, introduzira um arrepiante canto coral na chamada Ode à Alegria. A Nona Sinfonia é o nec plus ultra (*) musical do gênio humano. De fato, ainda que o bicho-homem e sua civilização durem mais um bilhão de anos, nunca ultrapassará, em genialidade musical, essa Sinfonia imortal - fecha.
Mas falávamos de Ray Conniff. Não dele propriamente, mas de uma época, de uma atmosfera sócio-polítco-econômico-científico-cultural absolutamente inédita. Mais evolutiva e de efervescências muito mais radicais do que foram os Anos 20, quando se esvaíam as fumaças da 1ª. Guerra e já estava no ar, desde o Tratado de Versailles, o cheiro fedorento da 2ª., que se prenunciava.
Os tempos de 60 eram diferentes. Eram tempos de inquietação e mudanças. Dormia-se num mundo e se acordava em outro. Estavam em cena os anticoncepcionais, os Beatles, o então chamado amor-livre, a bossa-nova que destronara a canção popular esgoelante, movimentos já da rebeldia jovem, da quebra dos padrões sócio-familiares que não queriam mudar, da derrocada dos fundamentos da sociedade. Tudo isso predizia – desde a vaga dos beatniks, a irreverente beat generation, com seus costumes inéditos – o maior evento contestatório do mundo, o famoso Festival de Woodstock, dos fins de 1969.
Daí pra frente quase nada resistiria ao vendaval novidadeiro que assolou o mundo. A Guerra Fria, no auge, os desaforos recíprocos entre a Casa Branca e o Kremlin, o Vietcongue afogado em napalm, Mao Tsé Tung esbravejando... Nada obstante, as mudanças aconteciam, frenéticas. Ditadores sucediam ditadores. Cia e KGB brincavam de gato e rato, gastando bilhões para manter as suas agências de informação. Sir Bond 007 surge com “licença para matar”. Brejnev estupora. Gorbachev tira a União Soviética da letargia imposta pela sedação stalinista. Operação Condor prende e arrebenta. Cai o Muro de Berlim. Árabes e judeus incansáveis nas suas escaramuças milenares, surgidas desde que Agar, emprenhada por Abrahão, fora por este desterrada com o pequeno Ismael. Ah, sei lá o que mais...
Agora a coisa é mais preocupante do que a crise da Baía dos Porcos, quando o mundo esteve, inteiro, à beira de uma catástrofe tipo Hiroshima. Agora o trem é mais feio. O Irã, para reeditar a glória de Ciro, prepara a sua bomba atômica, quando Ahmadinejad já é, ele mesmo, um explosivo de trilhões de megatons.
Falei de mudanças? Quá! Mudança coisa nenhuma. É a mesma rotina de demências. No fundo, no fundo, a mesma ânsia de confrontação patológica, da qual o ser humano não se desprega, movida pela enfermidade mais letal que existe: a busca de Sua Majestade, o Poder.
Papagaio! Eu não sabia que ouvir Ray Conniff era tão inquietante. Pensava que o suave Besame Mucho só me recordaria as horas dançantes de 1960 e o affair ministerial - Justiça versus Fazenda - protagonizado por Bernardo Cabral e Zélia Cardoso. Pronto, danou-se! Quem falou que agora terei coragem para ver Cary Grant e Deborah Kerr e ouvir os veludos de Nat King Cole no tema do antológico An Affair To Remember?
Parênteses - Na verdade, Ray Conniff não foi tão inovador assim. Coisa de século e meio antes Beethowen, que já rendera para sempre a arte musical com a Nona Sinfonia, introduzira um arrepiante canto coral na chamada Ode à Alegria. A Nona Sinfonia é o nec plus ultra (*) musical do gênio humano. De fato, ainda que o bicho-homem e sua civilização durem mais um bilhão de anos, nunca ultrapassará, em genialidade musical, essa Sinfonia imortal - fecha.
Mas falávamos de Ray Conniff. Não dele propriamente, mas de uma época, de uma atmosfera sócio-polítco-econômico-científico-cultural absolutamente inédita. Mais evolutiva e de efervescências muito mais radicais do que foram os Anos 20, quando se esvaíam as fumaças da 1ª. Guerra e já estava no ar, desde o Tratado de Versailles, o cheiro fedorento da 2ª., que se prenunciava.
Os tempos de 60 eram diferentes. Eram tempos de inquietação e mudanças. Dormia-se num mundo e se acordava em outro. Estavam em cena os anticoncepcionais, os Beatles, o então chamado amor-livre, a bossa-nova que destronara a canção popular esgoelante, movimentos já da rebeldia jovem, da quebra dos padrões sócio-familiares que não queriam mudar, da derrocada dos fundamentos da sociedade. Tudo isso predizia – desde a vaga dos beatniks, a irreverente beat generation, com seus costumes inéditos – o maior evento contestatório do mundo, o famoso Festival de Woodstock, dos fins de 1969.
Daí pra frente quase nada resistiria ao vendaval novidadeiro que assolou o mundo. A Guerra Fria, no auge, os desaforos recíprocos entre a Casa Branca e o Kremlin, o Vietcongue afogado em napalm, Mao Tsé Tung esbravejando... Nada obstante, as mudanças aconteciam, frenéticas. Ditadores sucediam ditadores. Cia e KGB brincavam de gato e rato, gastando bilhões para manter as suas agências de informação. Sir Bond 007 surge com “licença para matar”. Brejnev estupora. Gorbachev tira a União Soviética da letargia imposta pela sedação stalinista. Operação Condor prende e arrebenta. Cai o Muro de Berlim. Árabes e judeus incansáveis nas suas escaramuças milenares, surgidas desde que Agar, emprenhada por Abrahão, fora por este desterrada com o pequeno Ismael. Ah, sei lá o que mais...
Agora a coisa é mais preocupante do que a crise da Baía dos Porcos, quando o mundo esteve, inteiro, à beira de uma catástrofe tipo Hiroshima. Agora o trem é mais feio. O Irã, para reeditar a glória de Ciro, prepara a sua bomba atômica, quando Ahmadinejad já é, ele mesmo, um explosivo de trilhões de megatons.
Falei de mudanças? Quá! Mudança coisa nenhuma. É a mesma rotina de demências. No fundo, no fundo, a mesma ânsia de confrontação patológica, da qual o ser humano não se desprega, movida pela enfermidade mais letal que existe: a busca de Sua Majestade, o Poder.
Papagaio! Eu não sabia que ouvir Ray Conniff era tão inquietante. Pensava que o suave Besame Mucho só me recordaria as horas dançantes de 1960 e o affair ministerial - Justiça versus Fazenda - protagonizado por Bernardo Cabral e Zélia Cardoso. Pronto, danou-se! Quem falou que agora terei coragem para ver Cary Grant e Deborah Kerr e ouvir os veludos de Nat King Cole no tema do antológico An Affair To Remember?
É onde eu te falo...
(*) Traduza-se por “nada além daí, ponto máximo, supra-sumo,
etc”